Em 04 de outubro de 2024, Paulo Lacerda, Mestre e Doutorando em Turismo pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), foi premiado com o 1º lugar no Prêmio Mestre Destaque da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Turismo (ANPTUR). A dissertação foi orientada pelo professor Dr. Edegar Tomazzoni, docente da USP.
O trabalho analisou uma década de planejamento turístico em São Paulo, explorando o papel das redes de políticas públicas (conjunto de atores ligados à política pública) na formulação das políticas de turismo. A pesquisa foi desenvolvida sob a Teoria Neoinstitucional, a Análise de Redes Sociais (ARS) e Análise Temática.
A pesquisa focou nas redes de políticas públicas, que orientam a governança turística em São Paulo, cidade central no turismo latino-americano e um ambiente com forte participação de atores diversos no planejamento do setor. A partir de uma análise dos Planos Municipais de Turismo (PLATUM) — documentos que balizam as políticas turísticas da cidade — o estudo visou a entender como essas redes moldam o conteúdo e os processos de elaboração das políticas públicas de turismo.
Para isso, analisam-se três versões dos planos municipais: 2015-2018, 2019-2021 e 2024-2029. A análise revelou que essas redes, formadas por atores públicos, privados e do terceiro setor, são fundamentais para garantir a continuidade das políticas de turismo, mesmo diante de mudanças administrativas e rupturas institucionais.
Com uma abordagem qualitativa e interpretativista, a pesquisa combinou análise documental, entrevistas e observação não-participante para compreender a dinâmica das redes na governança turística. Essas redes mostraram que a governança do turismo em São Paulo depende, em partes, do poder posicional dos atores, com destaque para o setor associativo privado, que mantém uma presença constante nas discussões sobre políticas públicas. Além disso, verificaram-se algumas dificuldades de poder político do órgão local de turismo.
Um dos achados centrais foi a fragmentação institucional que permeia o setor turístico de São Paulo entre 2014 e 2023. Durante esse período, a responsabilidade pelo turismo oscilou entre a São Paulo Turismo (SPTuris) e a Secretaria Municipal de Turismo (SMTur), prejudicando a continuidade das políticas. A SPTuris, que atua no setor desde a década de 1970, desempenha um papel de destaque por seu poder posicional e institucional, influenciando o processo de formulação das políticas públicas, inclusive o PLATUM.
Esse poder posicional permite que essa organização oriente as diretrizes do setor, mantendo certo grau de estabilidade nas políticas, apesar das trocas de gestão. Entre os principais atores identificados, SMTur, SPTuris, São Paulo Convention & Visitors Bureau, Sindicato de Hotéis, Restaurantes e Bares e SENAC são fundamentais para assegurar a continuidade de pautas que respondam a demandas do setor.
Por exemplo, a inclusão de novos temas e demandas sociais nos planos é originária da atuação em rede, a qual permitiu que pautas de acessibilidade, turismo LGBT e afroturismo fossem adicionadas aos últimos planos, graças à participação de novos atores. Isso ilustra o caráter dinâmico das redes, que se adaptam a mudanças no perfil dos participantes e respondem a novas demandas.
A pesquisa responde a uma lacuna apontada na literatura, que carecia de estudos sobre variáveis institucionais no turismo, indo além dos aspectos administrativos. O estudo revelou o papel das redes e de seu caráter dinâmico na definição da agenda governamental e na política que guia as ações do setor. Isso foi identificado por meio das instituições formais (legislações, por exemplo) e informais (relações e valores compartilhados nas redes, por exemplo).
Por isso, o estudo demonstra que as redes de políticas públicas desempenham um papel crucial na formulação e adaptação das políticas de turismo em São Paulo. Mesmo com desafios institucionais e trocas frequentes de gestão, essas redes são capazes de preservar legados e manter estruturas de governança. Porém, a manutenção desses legados pode ser negativa, como a criação de consensos contrários à participação política, por exemplo. Além disso, as redes não demonstram, ainda, ter poder político suficiente para causar mudanças estruturais e intencionais no setor.
Assim, propõe-se, para continuidade da discussão, o questionamento: como manter as redes flexíveis a ponto de serem diversas nos atores e ideias, mas sólida, a ponto de ganhar poder político suficiente para alterar, de fato, a política no setor?
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