Em entrevista à coluna "4 perguntas", da newsletter Melhor do Sul (Gramado - RS), abordam-se os desafios e as tendências das metodologias da educação em turismo, em função dos impactos da pandemia (www.melhordosul.com.br).
Como vocês da USP estão enfrentando a pandemia ?
Na USP, as atividades tiveram andamento de forma remota (telepresencial, online), desde o início da pandemia. Foram necessárias adaptações, a fim de manter a qualidade das aulas, das orientações de trabalhos, das pesquisas e das reuniões. São novos desafios, mas considero que tem sido possível trabalhar nesse novo ambiente, em que prevalecem os recursos tecnológicos, como as plataformas Google Meet e Moodle (e-disciplinas). É a confirmação de uma tendência que se evidenciava há mais de dez anos. Para algumas atividades, como as bancas de defesa de dissertações e teses, já havia a participação de avaliadores externos, por Skype. Nessa modalidade, não há dispêndios de tempo e recursos, com deslocamentos e estadias. Essa dinâmica é também uma realidade nas empresas e na gestão pública, com a expansão do formato home office ou room office. Não significa que as participações não-presenciais sejam melhores que as presenciais. A convivência profissional é também convivência social, que é uma necessidade do ser humano e envolve aspectos lúdicos e emocionais. Além disso, no campo do turismo, a observação direta, in loco, é um procedimento de estudos inerente à atividade. Estar presente nos lugares e com as pessoas aprofunda os conhecimentos na área. Ainda assim, com as restrições pandêmicas, considerando as viagens a lazer ou a trabalho, evidenciou-se a discussão sobre o conceito de turismo virtual, modalidade em que o essencial é a sensação, não a mobilidade física.
Quais os principais desafios ao longo de 2021?
Contraditoriamente, foi preciso que houvesse a mudança, com o distanciamento, para que se implementasse o novo modelo. É preciso dinamizar as interações, motivando os alunos a serem mais protagonistas da produção do conhecimento, tanto na pós-graduação quanto na graduação. As limitações têm sido superadas. Nas aulas, ampliaram-se as possibilidades de contatos, de participações de profissionais, empresários e pesquisadores, de vários lugares do país e do mundo, para palestras e debates. São dinâmicas que enriquecem os estudos na área do turismo. Ainda há algumas resistências dos alunos em manter as câmeras ligadas, o que é compreensível, em função de eventuais limitações das conexões da internet e do consumo, pelo fluxo de dados. A grande questão é sobre a qualidade da relação ensino-aprendizagem. Em razão da diversidade de segmentos e da complexidade da sua gestão sistêmica, o campo do turismo é fértil em possibilidades de métodos de pesquisas e de produção de conhecimentos. A nova realidade social e econômica é desafiadora e, também, promissora. As tecnologias da informação e da comunicação tornam-se ainda mais facilitadoras da vida em rede e instrumentos essenciais para a atuação dos pesquisadores do turismo nas análises das enormes dificuldades, causadas pelos impactos da pandemia sobre o setor. Um dos projetos de pesquisa em andamento é o da política nacional de qualificação do turismo (PNQT), coordenado pelo Ministério e UnB, com atuação de 90 pesquisadores de 24 universidades públicas do país. Em São Paulo, a nossa equipe de cinco pesquisadores atua na capital e no litoral norte do estado. As redes de qualificação foram criadas com expressivas participações dos gestores do trade.
Quais as perspectivas no curto e médio prazo para quem ensina sobre turismo?
Os próprios conceitos ensinados na teoria da área são aplicados aos métodos pedagógicas, especialmente, a governança, as redes de cooperação e a inteligência de mercado no turismo. Esse sistema deverá se manter após a pandemia, e parte das atividades poderá ser na modalidade híbrida (remotas, com alguns encontros presenciais). Para entender o significado da governança no setor, as disciplinas dos cursos de graduação e de pós-graduação, como as que ministramos (turismo e desenvolvimento socioeconômico, gestão regional e mercado turístico), os estudantes são motivados a participar das discussões sobre o plano das atividades e a refletir sobre a coerência das propostas pedagógicas. A maioria dos alunos da graduação é de jovens que ainda não tiveram a primeira experiência profissional no setor. Mesmo que a formação acadêmica não seja garantia de efetivação no mercado de trabalho, os cursos superiores na área ainda são espaços de desenvolvimento de competências. A minha característica, na função de educador, tem sido de entender que o conhecimento não é monopólio das instituições de ensino. Estudar e produzir conhecimento em turismo significa manter conexões, reconhecer a sabedoria de quem está no dia a dia, observar, pensar e aprender com os atores dos territórios turísticos. Com esse espírito, os alunos produzem trabalhos em grupos, exercitam a cooperação em redes de turismo e aplicam métodos de coleta de informações sobre diferentes destinos. Nos projetos de pesquisa, na pós-graduação, a diferença é a limitação da observação e da interlocução presencial, porém, na essência, os métodos virtuais são eficientes e cientificamente consistentes.
Existe um crescimento exponencial na educação online mesmo de escolas, digamos assim, informais, como você percebe isso?
Em geral, não só na área do turismo, mesmo que a tendência seja de crescimento exponencial da oferta, deverá haver rigor dos órgãos responsáveis pelas avaliações dos cursos, bem como pelos próprios alunos. Então, os melhores cursos terão mais reconhecimento e procura. É preciso entender, porém, que conhecimento em turismo não se adquire só na universidade; viajar, por exemplo, também é aprender. Independentemente das formalizações acadêmico-institucionais, todos os conteúdos, que contribuem para o conhecimento em turismo, são importantes para melhorar o mercado e a sociedade. As possibilidades de pesquisas na área são abrangentes. Analisar vídeos e textos sobre turismo na internet, mediante critérios metodológicos claros, é um exemplo. Isso mostra que o aprendizado vai além dos modelos convencionais dos cursos, em que o professor dá aula e o aluno aprende. Não é somente o futuro da educação online que desafia os educadores, no Brasil e no mundo, mas os modelos de educação em si.
Edegar Luis Tomazzoni, professor da Universidade de São Paulo (USP), na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), no Curso de Lazer e Turismo e no Programa de Pós-Graduação em Turismo. Doutor em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes (ECA), da USP. Mestre em Turismo pela Universidade de Caxias do Sul (UCS).
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